QUOTIDIANO DOCENTE
Os professores têm tolerância de 10 minutos ao primeiro tempo da manhã. Findo esse período levam falta mesmo que cumpram o tempo restante. E têm de assinar ponto de aula a aula.
Andam na escola a correr, vão à casa de banho antecipadamente nos dez minutos de intervalo (porque depois não podem ir) e comem quando não têm fome (porque é a única altura em que é possível).
Têm reuniões extensas ao final da tarde e nas interrupções lectivas (cada vez menores) podem ser chamados a qualquer serviço presencial. Geralmente estão nessa altura a tentar organizar os milhares de documentos e papeladas que fazem parte do seu dia-a-dia.
Os professores atendem Encarregados de Educação mesmo fora das horas estipuladas porque são humanos e querem facilitar-lhes a vida. Muitas vezes disponibizam-lhes o seu número de telefone pessoal (não, não temos telemóveis de serviço) para poderem conseguir uma comunicação mais atempada, a bem dos seus alunos.
Os professores dão aulas e prestam outros serviços e cargos pedagógicos em várias escolas dos seus Agrupamentos (agora pretendiam alargar estas idas e vindas a várias escolas de vários Agrupamentos...). Nestes percursos utilizam os seus transportes e não têm quaisquer ajudas de custo para o efeito.
Os professores vivem anos, décadas num ambiente de ruído intensíssimo. Desgastam a voz e estão sujeitos permanentemente a situações de stress profundo. Sofrem doenças que seriam nitidamente de carácter profissional mas isso nunca foi reconhecido, ao contrário de outras.
Os professores são muitas vezes desrespeitados no seu local de trabalho e têm uma carreira à qual sucessivas tutelas e governos foram retirando dignidade e injectando tarefas que não são suas.
Os professores vivem mergulhados num oceano de burocracia que não lhes deixa tempo para trabalhar com os alunos de um modo sereno e mais conseguido. Por vezes tiram dias das suas férias para trabalhar para a escola e conseguir cumprir prazos burocráticos. Porque de outro modo era humanamente impossível.
Os professores ficam sem equipas de trabalho e pede-se-lhes que, sozinhos, cumpram o trabalho de 3 ou 4. Sofrem burnouts gravíssimos de que ninguém quer saber.
Os professores são acusados de terem muitas férias, mas têm exactamente as mesmas que os outros profissionais. A sua profissão tem características específicas que implicam paragens lectivas. Mas isto não são férias. Os professores têm mais trabalho para fazer sem ser as aulas. Não perceber isto é não perceber nada de nada.
Os professores passam ondas de calor e frio extremo nas suas salas despidas de qualquer conforto básico. Se quiserem têm de levar consigo pequenas fontes de calor ou ventoinhas, isto se o contador elétrico aguentar ( e a net também, já agora...) porque sabemos bem que raramente suporta todos os computadores ligados em simultâneo. Durante a pandemia chegaram a lecionar enrolados em mantas com janelas e portas abertas a ventilar nas madrugadas de Janeiro.
Há profissões ditas de desgaste rápido em que vemos os profissionais bem menos desgastados e a reformar-se fresquinhos e airosos. Até veem televisão enquanto se "desgastam"...
Não somos nós. Que assim que entramos numa aula nem conseguimos quase respirar durante 90 minutos.
Havia muito mais a dizer. Mas há por aí quem fique cego com a "partidarite" e a "umbiguite" e não tenha a hombridade de reconhecer seja o que for a mais ninguém.
Fartinha, fartinhos, disto tudo!
Paula Coelho Pais
Lisboa, 13 de Janeiro de 2023
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