Mundo da Informação

segunda-feira, 27 de setembro de 2021

Modernices alimentares

 Este texto é dedicado ao

"Chef" Avilez, que estragou dois magníficos restaurantes, o Tavares e,
principalmente, o Belcanto. E como esta praga não é nacional apenas,
dedicado também ao Alain Ducasse, que assassinou o em tempos magnífico
Louis XV, o restaurante (emblemático) do Hotel de Paris, em Monte
Carlo. Felizmente, neste caso, pelo menos continua a magnífica
garrafeira.
Restaurantes não são santuários...
Estou cansado da religião dos chefs: restaurantes não são santuários...
O melhor restaurante do mundo?
Ora, ora: é o Eleven Madison Park, em Nova York.
Parabéns, gente.
A sério.
Espero nunca vos visitar.
Entendam: não é nada de pessoal.
Acredito na vossa excelência.
Acredito, como dizem os críticos, que a vossa mistura de "cozinha
francesa moderna" com "um toque nova-iorquino" é perfeitamente
comparável às 72 virgens que existem no paraíso corânico.
Mas eu estou cansado da religião dos chefs.
Vocês sabem: a elevação da culinária a um reino metafísico,
transcendental, celestial.
Todas as semanas, lá aparece mais um chef, com a sua igreja,
apresentando o cardápio como se fossem as sagradas escrituras.
Os ingredientes não são ingredientes.
São "elementos".
Uma refeição não é uma refeição.
É uma "experiência".
E a comida, em rigor, não é comida.
É uma "composição".
Já estive em vários desses santuários.
Quando a comida chegava, eu nunca sabia se deveria provar ou rezar.
Os meus receios sacrílegos eram acentuados pelo próprio garçom, que
depositava o prato na mesa e, em voz baixa, confidenciava o milagre
que eu tinha à minha frente:
– Pato defumado com pétalas de tomate e essências de jasmim.
Escutava tudo com reverência, dizia um "obrigado" que soava a "amém" e
depois aproximava o garfo trêmulo, com mil receios, para não perturbar
o frágil equilíbrio entre as "pétalas" e as "essências".
Em raros casos, sua santidade, o chef, aparecia no final.
Para abençoar os comensais.
No dia em que beijei a mão de um deles, entendi que deveria apostatar.
E, quando não são santos, são artistas.
Um pedaço de carne não é um pedaço de carne.
É um "desafio".
É o teto da Capela Sistina aguardando pelo seu Michelangelo.
Nem de propósito: espreitei o site do Eleven Madison Park.
Tenho uma novidade para dar ao leitor: a partir de 11 de abril, o
Eleven vai fazer uma "retrospectiva" (juro, juro) com os 11 melhores
pratos dos últimos 11 anos.
"Retrospectiva."
Eis a evolução da história da arte ocidental: a pintura rupestre de
Lascaux; as esculturas gregas de Fídias; os vitrais da catedral gótica
de Chartres; os quadros barrocos de Caravaggio; a tortinha de quiche
de ovo do chef Daniel Humm.
Gosto de comer.
Gosto de comida.
Essas duas frases são ridículas porque, afinal de contas, sou português.
E é precisamente por ser português que me tornei um ateu dos
"elementos", das "composições" e das "essências".
A religião dos chefs, com seu charme diabólico, tem arrasado os
restaurantes da minha cidade.
Um deles, que fica aqui no bairro, servia uns "filetes de polvo com
arroz do mesmo" que chegou a ser o barômetro das minhas relações
amorosas: sempre que estava com uma namorada e começava a pensar no
polvo, isso significava que a paixão tinha chegado ao fim.
Duas semanas atrás, voltei ao espaço que reabriu depois das obras.
Estranhei: havia música ambiente e a iluminação reduzida imitava as
casas de massagens da Tailândia (aviso: querida, se estiveres a ler
esta crônica, juro que nunca estive na Tailândia).
Sentei-me.
Quando o polvo chegou, olhei para o prato e perguntei ao dono se ele
não tinha esquecido alguma coisa.
"O quê?", respondeu o insolente.
"O microscópio", respondi eu.
Ele soltou uma gargalhada e explicou: "São coisas do chef, doutor."
"Qual chef?", insisti.
Ele, encolhendo os ombros, respondeu com vergonha: "O Agostinho".
O cozinheiro virou chef e o meu polvo virou calamares.
Infelizmente, essa corrupção disseminou-se pela pátria amada.
Já escrevi sobre o crime na imprensa lusa.
Ninguém acompanhou o meu pranto.
É a música ambiente que substituiu o natural rumor das conversas.
É a iluminação de bordel que impede a distinção entre uma azeitona e uma barata.
É o hábito chique de nunca deixar as garrafas na mesa, o que significa
que o garçom só se apercebe da nossa sede "in extremis" quando existem
tremores alcoólicos e outros sinais de abstinência.
Meu Deus, onde vamos parar?
Não sei.
Mas sei que já tomei providências: no próximo outono, tenciono aprender a caçar.
Tudo serve: perdiz, lebre, javali.
Depois, com uma fogueira e um espeto, cozinho o bicho como um homem
pré-histórico.
O pináculo da civilização é tortinha de quiche de ovo do chef Daniel Humm?
Então chegou a hora de regressar às cavernas de Lascaux..."
.
*João Pereira Coutinho
day chef GIF

Islândia é primeiro país europeu onde mulheres formam maioria parlamentar

https://www.noticiasaominuto.com/mundo/1839730/islandia-e-primeiro-pais-europeu-onde-mulheres-formam-maioria-parlamentar?utm_source=notification&utm_medium=push&utm_campaign=1839730 

terça-feira, 21 de setembro de 2021

Como vai ser a Covid-19 daqui a 10 anos?

https://multinews.sapo.pt/atualidade/viagem-ao-futuro-como-vai-ser-a-covid-19-daqui-a-10-anos/?utm_medium=referral&utm_source=upday 


Será difícil imaginar como será a vida dentro de 10 anos, especialmente depois de a pandemia ter demonstrado como os planos podem ter de ser alterados e como as previsões podem estar completamente erradas. No entanto, este é um exercício importante para tentar, precisamente, antever alguns cenários e possíveis desafios.

Num artigo publicado na Fortune, Amesh Adalja, do Johns Hopkins Center for Health Security, explica que o novo coronavírus (SARS-CoV-2) continuará a fazer parte da sociedade, como uma espécie de convidado não solicitado. No entanto, será que terá uma presença tão forte como acontece hoje? Dentro de 10 anos, o vírus deverá manter-se em circulação lado a lado com os quatros grandes coronavírus, provocando doença ligeira ou moderada, especialmente no inverno.

Segundo o mesmo cientista, é raro conseguir erradicar por completo um patógeno da superfície da Terra: até ao momento, este feito foi alcançado apenas em relação à varíola e à peste bovina.

No caso do SARS-CoV-2, porém, não deverá ser esse o caso. Ainda assim, muito antes da próxima década, os cientistas esperam que a Covid-19 deixe de estar no centro de uma crise de saúde pública, a nível mundial. A vacinação será a principal responsável por esta mudança, especialmente se for dada prioridade a grupos de risco.

Comparando com os outros coronavírus que já circulam pelo planeta há mais tempo, estima-se que o SARS-CoV-2 resultará num máximo de dezenas de milhares de mortes nos Estados Unidos da América, por exemplo, no espaço de um ano – assim que a pandemia estiver controlada. Também neste país, apenas cerca de uma centena de milhar de pessoas serão hospitalizadas, com especial incidência nos meses de maior frio.

Números como estes não deverão representar um problema para os hospitais, que terão capacidade para lidar com os casos mais graves de Covid-19 sem risco de sobrecarga. Tal como acontece com outras doenças ou com a gripe mais tradicional.

Por outro lado, serão mais comuns as infeções junto de quem já está vacinado, bem como a possibilidade de reinfeção, uma vez que a imunidade começará a desvanecer com o avançar do tempo. No entanto, a reinfeção deverá provocar sintomas menos severos.

Dentro de 10 anos, prevê-se também que a vacina contra a Covid-19 tenha passado por um processo de melhoria, tornando-se mais potente e com menos probabilidades de reações adversas. Também deverá passar a fazer parte do calendário de vacinas das crianças.

No campo dos tratamentos, Amesh Adalja sugere que os medicamentos antivirais passarão a estar disponíveis de forma mais abrangente, mitigando sintomas, o nível de contágio e possíveis complicações.